terça-feira, 28 de abril de 2009

DR1 - CLC Deixem-se de conversa


Marcar um número e ligar a um amigo, enviar mensagens por SMS, tirar fotos e enviá-las são gestos triviais do quotidiano. Mas a banalidade destas acções pode ser posta em causa com a recente pesquisa de uma equipa de cientistas suecos liderada pelo neurocirurgião Leif Salford.

Este médico, que se tem dedicado a um estudo profundo dos telemóveis e dos seus efeitos no sistema nervoso, chegou a uma conclusão alarmante. As radiações electromagnéticas produzidas por estes aparelhos – que não são propriamente novidade, ao contrário das possíveis consequências sobre o cérebro – podem matar os neurónios. O estudo será publicado em Abril nos EUA, no jornal Nacional Institute of Environmental Health Sciences, e promete dar brado.

A provar-se tal hipótese, muitos afirmam que os processos judiciais em torno dos telemóveis serão, num futuro próximo, tão abundantes quanto as acções movidas devido ao consumo, activo ou passivo, de tabaco.

A experiência de Salford – que estuda esta questão desde 1992 – foi desenvolvida em ratos e centrou-se na chamada barreira hemato-encefálica, situada no cérebro, cuja função consiste em seleccionar e separar moléculas, proteínas e outros elementos daquele órgão. Esta barreira funciona como um filtro e a acção das radiações dos telemóveis sobre ela pode, segundo Salford, ser nefasta na medida em que a rompe, permitindo a entrada de substâncias nocivas ao cérebro. Elementos como a albumina, a partir do momento em que ultrapassem esta barreira, podem alterar os neurónios.

Para José Maria Bravo Marques, director do serviço de Neurologia do Instituto Português de Oncologia, poderemos estar perante novos dados na pesquisa das radiações dos telemóveis, pois até agora «não há nenhum estudo documentado que prove a relação das radiações electromagnéticas», com problemas oncológicos. Será necessário construir novos grupos de trabalho para produzir e tentar confirmar a pesquisa de Leif Salford.

Os operadores, por seu lado, mantêm atentos a toda a legislação nova sobre a matéria e remetem para os níveis mínimos sugeridos pelos padrões europeus. A norma actual estipula um limite de exposição a campos electromagnéticos em 300 ghz e foi determinada na sequência das polémicas sobre espaços mais adequados para a instalação de antenas de telemóveis. Mas os problemas não acabam aqui. As recomendações da praxe – não estar muito tempo em contacto com o aparelho, afastá-lo dos órgãos vitais como o coração e o cérebro, entre outras – também não parecem dar certezas absolutas de segurança. No entanto, segundo Isabel Ramos, presidente da Sociedade Portuguesa de Radiologia, a questão está em «medir a relação entre os benefícios e os malefícios das radiações». Os especialistas que devem determinar esse nível, tendo em conta que vale a pena utilizá-las quando as vantagens superam os constrangimentos. Neste caso, o que se ganhou com os avanços nas telecomunicações faz esquecer qualquer mal que aí advenha.

Contudo, devemos ter em conta um princípio: o uso dos telemóveis dever ser moderado, principalmente entre os mais jovens, cujas células têm menos defesas contra as radiações. São eles, acima de tudo, quem se deve deixar de conversa fiada.

Ricardo Nabais, in Única (Expresso), 1 de Março de 2003
CLC - Ana Vaz